terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Extintores - Otário outra vez

Departamento Nacional de Trânsito divulga com muito atraso deliberação que suspende obrigatoriedade de portar equipamento mais caro e ônus recai sobre os cidadãos
Mais uma vez o motorista é obrigado a gastar e depois vê tudo cair por terra. Muitos ainda acham que 2009 é o último ano em que será permitido circular pelas ruas em veículos equipados com extintores BC, que deveriam ser gradualmente substituídos pelo modelo ABC, considerado pelo Conselho Nacional de Trânsito (Contran) mais eficaz do que o outro. Acontece que, exatamente em 8 de março de 2005, uma ação civil pública de autoria da Comissão de Defesa do Consumidor da Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro (ALERJ) suspendeu a vigência da Resolução 157/04 do Contran, que amparava a exigência do novo extintor.Vergonha foi o Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) só ter divulgado uma deliberação (n.º 69) oficializando o fato em 4 de julho de 2008, 3 anos e meio depois da Resolução n.º 157 ter sido suspensa. A consequência disso é que poucas pessoas estão sabendo que esses modelos de extintores podem ser usados e, com medo de serem multados, compraram o modelo ABC, que custa mais caro.Para ter uma ideia, os valores dos extintores considerados no julgamento da ação, que podem ser tomados como o preço médio da época, era de R$ 90 o ABC e R$ 10 o BC (recarga). Hoje o valor do extintor ABC está mais ameno, custa em média R$ 55 e não pode ser recarregado (tendo a seu favor a validade de 5 anos) e a recarga do modelo BC aumentou para R$ 15 em média (tendo validade de apenas 1 ano). Num universo de 12 lojas especializadas em extintores consultadas não foram encontrados modelos BC novos.De acordo com a decisão do juiz substituto da 27ª Vara Federal, José Carlos Zebulum, a troca dos extintores iria onerar excessivamente os proprietários de veículos automotores sem trazer qualquer benefício para o consumidor. O juiz contesta as vantagens dos extintores ABC frente ao antigo, afirmando que não existem evidências técnicas de que o agente extintor à base de bicarbonato de sódio (BC) seja inadequado para o combate a princípios de incêndio.Esse foi um dos argumentos usados por Paulo Girão Barroso, advogado da Comissão de Defesa do Consumidor da Alerj, que obteve atestado de vários laboratórios dizendo que o poder de apagar chamas do extintor BC é o mesmo do ABC. Segundo Orlando Moreira da Silva, coordenador de infraestrutura de trânsito do Denatran, a argumentação que está sendo usada pelo órgão no recurso é que o modelo ABC pode ser usado para combater o incêndio em papel, madeira e tecido (materiais usados no interior do veículo), produtos inflamáveis em geral e equipamentos elétricos, enquanto o BC tem a limitação de não ser eficaz em materiais sólidos.
Sobre as vantagens alegadas a respeito da maior validade do modelo ABC, a decisão do juiz diz que a norma impõe prazo mínimo de validade, mas não garante que o consumidor não será obrigado a adquirir um novo extintor em prazo menor, seja pelo uso do equipamento ou pela data de fabricação (que certamente será anterior à sua compra). Zebulum ainda acrescenta à sentença que em países como a Suécia e Dinamarca, "cujas estatísticas de trânsito são bem melhores que a brasileira", não há a imposição do equipamento, questionando a exigência do uso de extintores veiculares.Marcelo José Araújo, advogado e professor de direito de trânsito do Centro Universitário Curitiba (UniCuritiba), afirma que não é a primeira vez que o Denatran suspende uma normativa depois de obrigar as pessoas a jogar dinheiro fora. Segundo Araújo, o Contran reage com muito atraso a respeito dos objetos que precisa regulamentar. "Deixam todos comprar faróis de xenônio, GPS, DVD, para depois regulamentar seu uso", diz. Outro fator que contribui para essa disritmia, de acordo com o advogado, é que o Denatran costuma agir por impulso, sem realizar grandes estudos sobre o assunto.
O que dizem as partes?
Contran. Apesar de ser mais caro, extintor ABC tem validade de cinco anos. Modelo ABC combate incêndio em papel, madeira e tecido (materiais usados no interior do veículo), produtos inflamáveis em geral e equipamentos elétricos, enquanto o BC não é eficaz em materiais sólidos.
Comissão de defesa do consumidor da ALERJ. Diversos laboratórios atestaram que o poder de apagar chamas dos extintores BC é o mesmo dos ABC. Impossibilidade de recarga. Extintor ABC é mais caro e não pode ser recarregado
Juiz. A medida veiculada na Resolução n.º 157 impõe um ônus aos consumidores sem caracterizar qualquer benefício. O fato da validade de cinco anos do modelo ABC não garante que o consumidor não será obrigado a adquirir um novo extintor em prazo menor. Não há qualquer evidência técnica de que o extintor BC seja inadequado para ser usado em casos de princípios de incêndio. Não se espera que o extintor, manuseado por pessoas sem preparo técnico para combater fogo, seja capaz de debelar incêndios de maiores proporções. Por isso o uso de extintor em veículos tem caráter meramente preventivo. As situações de maior gravidade só poderão ser enfrentadas por pessoas habilitadas. A realidade demonstra que o uso de extintores em veículos tem se revelado de pouca ou nenhuma utilidade para a população
Linha do tempo
Veja como o Contran demorou a divulgar a suspensão dos efeitos da Resolução n.º 157
22 de abril de 2004
Contran divulga Resolução nº 157, que fixa especificações para os extintores de incêndio, entre elas a que introduz o uso dos extintores do tipo ABC
8 de março de 2005
Decisão judicial suspende eficácia da Resolução n.º 157
4 de julho de 2008
Contran publica Deliberação nº 64, que suspende os efeitos da Resolução nº 157
Povo fala
Você sabia que a Resolução n.º 157 estava suspensa desde 2005? O que você pensa sobre estas normas que são lançadas e depois suspensas?
"Não sabia. É uma questão de oportunismo para não sei quem levar vantagem. Igual aquele kit de primeiros socorros. Só falta agora mandarem a gente tirar um diploma de médico" - Antônio Eustáquio Santiago, taxista.
"Não. Pior que eu caí nessa e comprei um extintor novo na época. São tantos absurdos que a gente nem sente mais" - Fernando Flávio, artista plástico.
"Fiquei sabendo. É um jogo de cartas marcadas para beneficiar alguém" - Lúcio Flávio Franco Soares, economista.
"Eu não sabia. Acho que a intenção pode até ser boa, mas os governantes precisam pensar direito antes de agir" - Isabela Queirós, empresária.
"Não. Acho que, pelo menos, essas coisas deveriam ser mais bem divulgadas" - Paulo Bretz, motorista.
"Não fiquei sabendo. É um jeito de fazer a gente gastar dinheiro à toa. Dá a impressão de que tem convênio com alguém para tirar dinheiro da gente, igual àquela taxa de licenciamento, que não serve para nada" - Orlando Lúcio de Melo, motorista.
"Não. Acho que, se possível, as pessoas que gastaram dinheiro com isso deveriam ser reembolsadas" - Raquel Antonini, cantora e atriz.
"Fiquei sabendo porque meu irmão é engenheiro de segurança. Isto é um jeito de tirar alguma vantagem do povo" - Alessandro Meneghini, comerciante.
"Não fiquei sabendo. O governo tem vontade de acertar, mas infelizmente as medidas são ineficazes" - Pedro Esmeraldo, advogado

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