quinta-feira, 19 de março de 2009

Toyota Corolla x Honda Civic


Casta nobre, última safra: Convidamos você a nos acompanhar nessa degustação de Corolla e Civic, reservas especiais da casas Toyota e Honda.

Nos anos 90, o Brasil se abriu às importações e beber vinho virou moda. Qual vinho? Três tipos: francês, italiano ou alemão. O tempo passou, e a classe média aprendeu a apreciar diferenças entre Malbec e Merlot. Aconteceu com as bebidas e, felizmente, não só com elas. A oferta de carros ficou específica, para paladares mais apurados. Honda Civic e Toyota Corolla, sedãs médios fabricados no Brasil por empresas japonesas, são diferentes o bastante para não merecer o mesmo rótulo. Principalmente nessa última safra.

Comecemos pelas boas semelhanças. Civic e Corolla são os melhores sedãs a brotar da nossa terra, os únicos com espaço nas mesas fartas do Primeiro Mundo. Lugar de destaque, sempre entre os quatro mais vendidos do mercado americano. Mais que curiosidade no currículo, é um atestado de qualidade com reflexos diretos no mercado brasileiro. Como mostra nossa pesquisa Os Eleitos, que mede satisfação do cliente, Civic e Corolla são aqueles que você pode consumir sem medo de dor de cabeça no dia seguinte. Na última edição, ficaram em primeiro e segundo lugar entre os sedãs médios. Entre marcas, Honda e Toyota empataram na liderança (e lideram desde 2005, quando a categoria foi criada). Ou seja: se você encontrou esta revista na sala de espera do consultório, está em dúvida entre os dois modelos e acaba de ser chamado pelo médico, vá em frente, escolha o que achar mais bonito. Estará bem de carro pelos próximos anos. Mas aqui é a Wine Spectator, a bíblia de quem leva vinho a sério. Vamos atrás dos taninos e retrogostos que só ficam evidentes no ritual de degustação.

Semanas atrás conheci a décima geração do Corolla, mostrada na última edição. Voltei da pista de testes seguro de que tinha um grande carro nas mãos. Muitos ficaram decepcionados com o estilo conservador, mas isso nunca foi decisivo no sucesso dele. Confiável como um Corolla, só que mais espaçoso, equipado e de visual renovado. É uma receita poderosa. A Toyota promete tomar a liderança que perdeu para o Civic e não largar mais.

Se o antigo era um exemplo de eficiência, mas pobre de equipamentos, essa nova versão XEi é ainda mais prestativa e chega a ter requintes dispensáveis, como o retrovisor que se fecha sozinho, num toque de botão. Mas continuo sem entender o que levou a Toyota afirmar, um ano atrás, que seu novo modelo faria o Civic parecer velho. Não faz, nem é do jogo fazer. A tradição diz que o Corolla dá saltos grandes nas gerações ímpares e pequenos nas pares (esta é a décima). Saltos grandes e pequenos, claro, dentro dos parâmetros de discrição da marca. A Toyota é o conservadorismo em forma de montadora. Se algum Corolla apareceu no filme Velozes e Furiosos, foi mera coincidência.

Mas o filme dá destaque a cinco Honda Civic da quinta geração (de 1992 a 1995, a primeira importada para cá). Foi um dos carros favoritos dos tuneiros americanos nos anos 90 - deles e de um público incrivelmente variado e numeroso. Surpresa com as boas vendas e disposta a mantê-las, a Honda tornou-se cautelosa nas duas gerações seguintes. A suspensão dianteira mudou de double wishbone para McPherson, mais barata, as versões esportivas minguaram e o Civic transformou-se num Corolla com menos motor e mais acabamento. Foi essa fase que a gente viu de perto, nos modelos fabricados no Brasil. Na oitava geração, a Honda retomou a tradição de não respeitar tradições. Quando ela foi lançada, em maio de 2006, voltei da pista de testes certo de que tinha nas mãos um clássico. O carro que o pessoal vai colecionar em 2028.

Ainda assim, o Civic desafia minha memória. Sempre que aparece na redação, vejo que é melhor do que eu lembrava. Uma sensação boa que, por muito tempo, sentimos a respeito do Golf. O volante pequeno e justo, a posição de dirigir acolhedora, o pedal de acelerador preso no chão. O comprador de BMW Série 3 poderia levar o Civic e dar a volta ao mundo com o troco. As grandes diferenças do BMW estão na tração traseira e no status. Jeremy Clarkson, guru do programa inglês Top Gear, diz que a Honda é a única marca japonesa que realmente tem paixão por carros. (Nem a Subaru? Nem.)

A cabine do Civic é ambiciosa. Trincos de porta ao contrário, freio de mão em forma de "Z"... Ousadias de estilo desse tipo costumam ser apenas isso, ousadias. Algumas do Civic, ao contrário, são o clichê feito pela primeira vez. O freio de mão é mais fácil de puxar e livra espaço para um ótimo portaobjetos entre os bancos. Foi seguido pelo Volvo C30 mais recente e será por outros carros. Talvez, um dia, pelo Corolla. O painel com velocímetro e conta-giros empilhados não será copiado. Ele vai contra a tendência dos carros de passeio modernos. O brilho azul-turquesa e branco está sempre ali, tomando espaço do seu campo de visão. Sua presença diz muito sobre o carro da Honda.

Numa viagem de 200 quilômetros, o dono do Civic chegará mais cansado do que se estivesse num Corolla. Ele e sua família: o carona tem pouco espaço para apoiar os pés, na parede sob o painel, e o espaço no porta-malas é insuficiente. As estradas do carro da Toyota sempre parecem mais bem asfaltadas - certos buracos que marcam no Civic simplesmente desaparecem. E não pense que o Corolla é molenga: dentro do uso normal, os dois fazem as mesmas curvas. No anel inferior da pista de Limeira, começaram a cantar pneu à mesma velocidade, 80 km/h - o Civic, mais alto. Em mudanças de faixa e ziguezague, é o carro da Toyota que inclina menos a carroceria. Parte da suavidade do Corolla vem da caixa de direção: não é tão direta e seu sistema de assistência elétrica deixa o volante mais pesado que o do rival em alta velocidade (e bem mais leve em baixa, trazendo conforto no estacionamento). O contraponto vem no teste de desvio de emergência - uma condição extrema, muito além do uso comum -, quando é mais difícil trazer de volta o Corolla no braço. Nessa hora, torça pela eficiência dos airbags laterais, que só ele traz de série. O carro da Toyota é menos divertido, mas não é acomodado.

Os dois motores 1.8 16V são importados do Japão (o da Honda passará a ser fabricado aqui em maio) e estão entre o que há de melhor no nosso mercado. Em nome de menor vibração e maior precisão, têm bloco de alumínio, balancins roletados e bielas fraturadas. Acelerador eletrônico e comando de válvulas de admissão variável trazem suavidade ao dirigir e os quatro bicos injetores da partida a frio garantem partidas fáceis. O câmbio da Honda é mais moderno: tem cinco marchas, com travamento de conversor de torque (que reduz a patinação típica desse tipo de transmissão) em todas. O Toyota tem quatro marchas e travamento de conversor apenas em terceira e quarta. Ainda assim, o Corolla foi melhor nos testes de desempenho e consumo.

No dia-a-dia, outra surpresa. Não esperava que o trilho sinuoso do câmbio do Corolla fosse tão prático. Não é interativo como as borboletas no volante usadas pelo Civic, mas essas são um luxo que a Honda guarda para a versão EXS, de 85 235 reais. Esse LXS (de 72 160 reais, automático com bancos de couro) não tem computador de bordo, faróis de neblina, piloto automático, ar-condicionado digital, retrovisores com recolhimento elétrico e piscas, ou comandos de rádio no volante. Verdade que nada disso é essencial. Do ponto de vista da engenharia, são meros penduricalhos, que somados talvez custem menos que o refinamento de chassi do Civic. Mas é fato que são bem-vindos, são notados por qualquer pessoa e, por 73 590 reais, o Corolla XEi (automático com bancos de couro) tem.

No Corolla, o motorista senta-se ereto, mais voltado para as janelas e para o mundo que está diante delas. Enxerga o painel (com sua festiva iluminação vermelha, laranja e branca) - e o carro, por extensão - apenas quando quer. Assim como a Honda, a Toyota tinha um plano e o cumpriu com coerência. Planos diferentes. Você não se apaixona por um Corolla, aprende a gostar. Sem dirigir outros carros, é capaz de o motorista nem notar o admirável esforço da Toyota em amenizar as durezas do trânsito. O foco não está na máquina, mas na vida de quem a usa.

O Civic é um carro exuberante. Sua suspensão traseira multilink, com braços de alumínio, mostra todo seu valor em descidas de serra e pistas irregulares. Explicar é difícil: digamos que o labirinto dentro do seu ouvido sente-se mais à vontade. O equilíbrio de chassi é tão bom que, para enrijecer o carro para a versão Si, bastou mudar as rodas. Diante de uma manobra brusca de desvio, a direção (direta como a de um superesportivo) é capaz de retomar o controle tão rapidamente quanto a traseira do carro escapa. Por outro lado, o Honda é egocêntrico. Pedirá atenção mesmo quando você não quiser.

O Corolla recebe os passageiros (e suas malas) com maior generosidade e os entrega mais relaxados no fim da viagem, para que possam aproveitar melhor os queijos e vinhos. Quais? O dono do Corolla talvez não saiba de marcas e nomes tão bem quanto o dono do Civic - este sim, um sommelier. Mas irá saborear com mais calma.

FOTOS


ETERNOS RIVAIS


Corolla VII: chegou aqui em 1994, importado, sem destaque. A classe média encantava-se com o Omega.


Corolla VIII: o fiasco do farol redondo fez cair o presidente. O irmão de cara careta passou a ser feito aqui em 1998.


Corolla IX: com Brad Pitt no anúncio e leve apelo esportivo, o modelo 2002 toma do Civic a liderança.


Civic V: chegou aqui em 1992. Tinha versões targa e hatch esportivo VTi, 1.6 aspirado com 160 cv.


Civic VI: passa a ser feito aqui em 1997. Durável e bem acabado, tira do Vectra a preferência da classe média.


Civic VII: cara parecida e suspensão piorada em 2001. O Corolla IX veio com jeito de carro maior e...

CIVIC LXS - R$ 72 160
Para quem gosta de dirigir. Requinte na fi cha técnica, mais que na lista de itens de série.

DIREÇÃO, FREIO E SUSPENSÃO

É um esportivo em pele de sedã, com respostas rápidas e precisas. Vivese intensamente ao volante do Civic - embora isso às vezes possa ser cansativo.

MOTOR E CÂMBIO
Motor e câmbio de classe internacional, com desempenho de 2.0 e consumo de 1.0.

CARROCERIA

Reúne o que o Civic tem de pior (espaço no porta-malas) e melhor (estilo de dar inveja nos donos de Corolla).

VIDA A BORDO

Faltam equipamentos e suavidade ao rodar, mas a cabine é um projeto muito bem feito e executado com capricho. Isso traz confortos que você não vê, mas sente.


SEGURANÇA

Limpadores com eixo nas beiradas do párabrisa e palhetas sem arco são mais seguros ao pedestre. O acerto de direção e suspensão ajuda no controle do carro em situações de urgência, mas falta o airbag lateral do Corolla.

SEU BOLSO

Faltam equipamentos. Mas o custo de manutenção é baixo e não há dúvida sobre a facilidade de revenda: dois anos após o lançamento, é um carro com fila de espera.


DIMENSÕES
Comprimento/entreeixos (cm): 449 / 270
Altura/largura (cm): 145 / 175
Porta-malas (litros): 340
Peso (kg): 1 260
Peso/potência (kg/cv): 9
Peso/torque (kg/mkgf): 71,2
Diâmetro de giro (m): 10,6

FICHA TÉCNICA
Motor: dianteiro, transversal, 4 cil. / 16V / 1 799 cm3
Diâmetro x curso: 81 x 87,3 mm
Taxa de compressão: 11,5:1
Potência: 140 / 138 cv a 6 200 rpm
Torque: 17,7 / 17,5 mkgf a 4 300 / 5 000 rpm
Câmbio: seqüencial / 5 / dianteira
Direção: hidráulica / 2,8 voltas
Suspensão: Dianteira: McPherson Traseira: independente, duplo A
Freios: discos sólidos
Pneus: 205/55 R16


COROLLA XEi - R$ 73 590
Traz luxos como computador de bordo e ar digital. Nele, o asfalto parece mais liso.

DIREÇÃO, FREIO E SUSPENSÃO

O Corolla é uma ilha de tranqüilidade, inclina pouco e ingnora buracos. A direção é mais leve que a do Civic ao estacionar e mais pesada na estrada.


MOTOR E CÂMBIO

O motor não tem números expressivos de potência e torque máximo, mas sua ótima elasticidade esconde as limitações do câmbio. Juntos, fazem o Corolla andar direito e beber menos que carro 1.0.


CARROCERIA

O novo Corolla é uma ducha de água fria, para quem esperava uma resposta ao arrojado Civic. Mas é imponente.

VIDA A BORDO
Vidros um-toque para todos (com fechamento na chave), piso plano e bom isolamento sonoro.

SEGURANÇA

Destaque para os quatro airbags, ABS e EBD. Todos a bordo têm cinto de três pontos e apoio para a cabeça. O capô elevado, mais distante do motor, é mais seguro num atropelamento.


SEU BOLSO

A generosa lista de itens de série cobre com sobra a diferença de preço para o Civic. A mecânica mudou pouco, então esse Corolla será tão tranqüilo de manter quanto o anterior.


DIMENSÕES
Comprimento/entreeixos (cm): 454 / 276
Altura/largura (cm): 176 / 177
Porta-malas (litros): 470
Peso (kg): 1 230
Peso/potência (kg/cv): 9
Peso/torque (kg/mkgf): 70,3
Diâmetro de giro (m): 10,6

FICHA TÉCNICA
Motor: dianteiro, transversal, 4 cil. / 16V / 1 794 cm3
Diâmetro x curso: 79 x 91,5 mm
Taxa de compressão: 11,3:1
Potência: 136 / 132 cv a 6 000 rpm
Torque: 17,5 / 17,3 mkgf a 4 200 rpm
Câmbio: automático / 4 / dianteira
Direção: elétrica / 3 voltas
Suspensão: Dianteira: McPherson Traseira: eixo de torção
Freios: discos sólidos
Pneus: 205/55 R16

VISIBILIDADE
- Pontos cegos:
A parte escura representa a área que o motorista não enxerga em manobras ou em movimento

Clique aqui e veja a tabela comparativa

VERDICTO

O Civic é brilhante ao aproximar motorista, carro e asfalto. Não vai tão bem em espaço interno, maciez ao rodar e itens de luxo. O Corolla suaviza as reações do carro em favor do conforto, é bem equipado e mais espaçoso. Objetivos opostos que os dois cumprem muito bem. Numa escolha passional, ficamos com o Civic. É o carro que dá mais orgulho ter e que deixa mais saudade quando vai embora.

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